sábado, 7 de novembro de 2009

O diálogo do Samurai com o Ronin iniciante

ao mestre de ontem e sempre, Sandro Gustavo Manoel.


O vento bate nos bambus de tamanho médio. Amassados para a lateral cuidadosamente. O Ronin chega até o samurai que está de costas para ele, cerca de dez metros, olhando para o lago. O Samurai, sem se virar, fala mansamente:
- Veja o bambu, ronin. Ele vem da idéia taoísta segundo a qual se deve ceder a situações ou condições externas. Seus galhos são amarrados de forma que a planta cresça se curvando para o lago, se houver algum, como em reverência e respeito àquele que aprecia a paisagem. É a imagem do bambu, que resiste a verga sob o rancor da tempestade, para em seguida voltar e erguer-se e aparecer novamente em todo seu esplendor. A flexibilidade do bambu conduz a capacidade de adaptação e mudança.
- Vim desafiá-lo samurai andarilho, errante. Soube que és lendário na espada e sou digno de ferí-lo ou até matá-lo.
- Pode mesmo chegar a me matar, ou me ferir. Mas o fato é: considera-se um samurai? O samurai superior não segue apenas o caminho da espada. Segue também o caminho da pena. A isso é chamado Bunbu-ryodo. No inglês, sword é espada e word é palavra. Não é a toa que apenas uma consoante divide as duas idéias. Samurai significa aquele que serve. Servir ás letras, servir á um propósito maior que seu umbigo fétido, infantil e indigno de ser aberto como uma vala pela minha Katana Masamune, para que suas tripas venham a servir de alimento para o pasto.
Nisso, o ronin retira a espada. O Samurai, sem se virar, ainda de costas complementa:
- Você deve usar o Iaijutsu, o laidô. Saber quando e porque desembainhar a espada. Soa-me imensamente infantil uma investida como essa. Veja o Toro, a lanterna de pedra, seu significado é a iluminação da mente, a simplicidade da perfeição do corte, o certeiro golpe indefensável. Originalmente, elas eram usadas para iluminar as entradas dos templos para os cerimoniais do chá feito às escondidas durante a noite.
- Cale a boca, você irá morrer.
- Cale-se você. Não aceitei ainda o desafio e se quer que sua morte tenha algum sentido, escute-me. O Hankumdo ou o bushido é de um modo geral a aceitação final da morte. Sinto em sua respiração preocupação, anseio de afirmação e ansiosidade. Miyamoto Musashi, o mais lendário e particular ronin disse sobre o caminho: Os homens devem moldar seu caminho. A partir do momento em que você ver o caminho em tudo o que fizer, você se tornará o caminho. A vida de alguém é limitada, mas a honra e o respeito duram para sempre e você faz tudo para o agora, tudo para uma realização pessoal e dotada de vaidade. Mesmo que eu perca na prática, essa batalha teoricamente já está ganha.
- Chega.
O Ronin correu em direção ao samurai. Parou vinte centímetros antes do corpo do samurai com a espada ainda em posição de ataque. O samurai parecia não ter se movido, quando o ronin escutou um som agudo e baixo de espada sendo retornada á bainha. Metade de seu corpo caiu, com um corte diagonal, num baque seco, e a parte inferior foi ao chão mais demoradamente.
Nisso, o samurai olhou para o sangue que jorrava dos dois pedaços do corpo e fazia um barulho semelhante ao vento, em seguida olhou ao lago á sua frente e pensou: O fluxo da água, ronin, simboliza o nascimento, o crescimento e a morte.